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domingo, 9 de setembro de 2007

Dona Antônia e Seu João

Cresci em vila de paralelepípedos com casas de pouco muro e portão, de longas reuniões na calçada das noites de verão, das vendedoras de Yakult, de batata doce assada em fogueira, de casas pouco construídas, de esconde-esconde em casas pouco construídas, de Dona Antônia e suas coxinhas, de Seu João e suas plantações de mandioca num terreno baldio qualquer da rua.
Cresci ouvindo, quando entardecia, a voz com alguma vibração que cantarolava catequizando o bairro todo. Dona Antônia, uma senhora de estatura robusta, ia até a pequena sacada de uma “casa amalera”, que ela mesma pintou, para lavar suas roupas e aproveitava para soprar melodia numa ópera sem o menor repúdio ou vergonha. Cantava alto. Seu vozear despertava a rua de ponta a ponta. Uma mesma voz que “ia loooonge” nas estradas da cidade pequena que nasceu, conta ela, próxima a Juazeiro do Norte, quando saía pra vender pequi no centro.

Senhora de uma das primeiras casas da vila, quase não viajava. Sua pele mulata favorecia a peleja pela cidade inteira à pé, sabendo dizer com precisão onde era possível encontrar qualquer igreja... A “briba” sempre guardava algumas notas de pouco valor dentre suas páginas amareladas e pouco lidas, notas que sempre iam parar nas mãos de algum pastor fervoroso ou nas de Juliano, seu neto, garoto que era surpreendido em meio de brincadeira de amigos com a inquisição em voz alta e atropelando palavras:
─Juliãããããããno!!! Quedê o dinhero que tava dento da minha briba?! – um susto, indiferença e nenhuma resposta.
Dizer o quê? A essas alturas os salgadinhos, as pipas, as “fubecas”... já estavam pagas.


Impossível deixar de lembrar o dia que a “casa amalera” ficou no escuro por conta dum “cuitu ciquitu”. As coxinhas com massa de batata, inesquecíveis, necessitariam de um esforço extra, mas o “cuitu ciquitu” não seria barreira para sair cidade afora as vendendo. Complementar a aposentaria era questão de sobrevivência. Só o que recebia como aposentada não dava para comprar, com folga, o “Jubiloso”, como dizia, referindo-se à milagrosa ginkgo biloba.

Coisa de muito tempo atrás, Antônia, menina nova de muita prenda, trabalhava no campo quando, num levantar das vistas pra esquecer da vida sofrida, encontrou, nas reentrâncias do cafezal, olhos azuis e de forte expressão...
“Até tinha otros môço, mas era Jão mesmo que era pa cê”.

Dona Antônia, desta feita, já havia conquistado o apreço de seu tio mais abastado, que dispunha de afeição diferenciada por ela em relação às outras sobrinhas. Assim, foi pouco pecado pedir ao nobre “um poico, um boio, uma vaca, pá começá uma criação”. Com pouco tempo, Seu João e Dona Antônia tinham um pedaço grande de terra, algumas cabeças de gado e “feizuada” na celebrações da família. Mas tudo isso é deixado para trás quando o único filho do casal, buscando coisa diferente, vem para São Paulo.

A instituição Família fala mais alto e o casal aporta no interior do estado, construindo e habitando a segunda casa duma vila que seriam protagonistas. Esta em que cresci. A mesma que tem lembranças de Seu João berrando “deixe de zuada menino”, na tentativa de nos sensibilizar para o fato de que bola batendo no portão é um tanto incômodo. A rua que, com tantos cachorros, fez sair da boca de Dona Antônia, num desabafo, que “esses cachorro cómi meu juízu”. A rua que cresci. A rua de Dona Antônia e Seu João.
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Dona Antônia
* 4 de janeiro de 1928 
5 de setembro de 2007
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Alex Pinheiro/Jeffy

16 comentários:

  1. E o que seria da simplicidade se não existissem Antonias assim, né? deus há de trazê-la Consigo agora.

    []´s!

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  2. Alex, td bem?

    Creio que vc nao tenha visto o mail que te mandei ontem. Era um convite pra postar no blogdesete, onde participo às terças. Essa é a semana dos convidados, então, como já estou atrasado, vou tomar a liberdade do levar um poema seu pra lá, ok? Assim sendo, passe por lah depois.

    Será um prz apresentar tua poesia aos companheiros de lá, esta que gosto muito.

    brigadao!

    []´s

    Mucio Goes

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  3. teu blog ta estranho aqui
    nao to conseguindo ler

    O.o

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  4. Grande dona Antónia. A história de uma pessoa confunde-se com a do local onde viveu. Grande narrativa! Gostei. Parabéns.

    (off topic)
    Servindo de resposta ao teu comentário no "maisastuto", vou falar daquilo que preenche mais de meia hora dos telejornais portugueses: suposta agressão do Scolari a um jogador sérvio. Acho eu que o gesto do Scolari, sendo condenável, não é nada do outro mundo. Tentou agredir, e daí? Não vai ser a última agressão no mundo da bola. Fico espantado como há gente tão púdica no meu país sempre pronta a condenar. Vi um cínico comentador que me meteu nojo, não sei onde conseguem ver defeitos em tudo que o Scolari faz; há quem não lhe perdoe por pensar pela própria cabeça e, porque não dizê-lo, há quem não lhe perdoe por ser brasileiro. Aos jogadores, os críticos perdoam tudo! Esses é que mereciam levar com críticas! Volta Figo!
    Lá está o país do imediato, do sensacionalismo, da modinha do hoje: hoje Scolari é mau, bate nas pessoas (todas!).
    Ninguém pode dizer que nunca perdeu as estribeiras. Mau exemplo? Só vê um mau exemplo naquela atitude quem quiser, eu vi um homem que tem ao peito um emblema, uma causa, que lidera um "exército" que nem é o da sua pátria como os patriotas nunca fizeram! Mas isso sou eu...

    Cumprimentos transatlânticos.

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  5. Que linda história, o que seriamos sem a simplicidade de pessoas como Dona Antonia!?

    Beijos

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  6. hehe... muito bom!
    vim trazido pelos bons ventos do Blog de Sete, e gostei muito, tanto da prosa quanto da poesia.
    Abraço goiano!

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  7. figuras da sua infância e figuras da rua. figuras eternas.

    abraços.

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  8. Múcio L Góes:
    Devo dizer qdo tenho palavras que tu tem trazido do que tem melhor: palavras,,, todas elas dirigidas com sinpatia e admiração que jamais imaginei inspirar... Obrigado mesmo, por todos os bons momentos que tem me proporcionado com suas palavras.

    Felipe Dib:
    Deve ter sido um "acidente" por aê, já que nessas bandas as coisas estão bem,,, mas d qqr forma eu agradeço todo o tempo que despendeu aqui.

    Astuto:
    Confunde-se mesmo,,, ela é patrimônio cultural por acá...
    Qto a Felipão eu dizia da sua tendência a desordem e aos "bons" modos,,, rs... gosto dele,,, personalidade forte e talz,,, mas pouco louvável vah! rs
    Vlw Astuto,,, prazer

    Jana:
    Seríamos alguma coisa, mas com pouca "história",,,

    Moacircaetano:
    Seja bem vindo ao meu barraco cultural, Moacir,,, tenho prazer em construir conexão literária contigo... Obrigado pela visita

    Rafael Velasquez:
    Figuras que me construiram, com certeza, Buda... Duma base moral, além da cultura e educação...

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  9. lembrar da infancia me da tristeza, mto. nao entendo...

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  10. lembranças vivas
    naquilo que vai
    mas não parte
    mesmo com a morte.

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  11. ah! sobre as imagens que uso: no vomitando e no deus, são fotos que faço. nos demais blogs, imagens daqueles que gosto(por vezes não as credito, mas só quando as mesmas são, digamos, "conhecidas". como a última do espantalho, que é do van gogh.)
    abs.

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  12. Saudade do tempo das brincadeiras na calçada...

    Que lindo texto!
    Que linda Dona Antônia!
    Lembranças para serem bem guardadas.

    Ahh, adorei te ver no blog de 7 cabeças! :)

    E adorei o vídeo-poema!

    Beijos!

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  13. olá! voltei das minhas ferias:) eu gosto de recordar a infancia pois fui feliz e tive uma infancia regada de bons momentos:) ás vezes nao me divertia mais pois vivia a vida agarrada nas saias de minha mae:) era uma loucura as coisas k eu fazia k com 6 anos d idade já convencia a minha professora a me deixar ir a casa só pa ver minha mãe:) era uma loucura total.:) se kiseres vem receber um abraço aki no meu blog. bjo e linda a tua historia.
    carla granja

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  14. Line:
    Que triste, mulher,,, a infância tem suas sombras mesmo...

    Douglas D.:
    Não parte não,,, acredito que é preciso muito mais que a morte pra matar alguém...
    Reafirmando: belas imagens tens no "espantalho"

    Marina Morena:
    Eu amo minha infância, rs...
    Passar pelo blog de 7 foi uma grande honra pra mim,,, bom que conheceste meu espaço,,,

    Carla Granja:
    Obrigado, Carla... Vou de passar por aí quando tempo me sobrar...

    Obrigado a todos que por aqui deixaram suas impressões

    Abraços e novas invenções!

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  15. Que lindo! A parceria rendeu um texto sensível e belas imagens.
    Parabéns!
    E só hoje depois de umas várias visitas consegui ler como se deve. Explico-me: visitas em casa.
    Beijo.

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  16. Nossa, me senti velha! Lembro dela e das coxinhas haha, me recordo que quase sempre visitávamos ela.

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